Eis-nos,
uma vez mais, às vésperas de mais uma Páscoa. Nosso pensamento e nossa emoção,
ambos cristãos, manifestam nossa sensibilidade psíquica.
Deixando
de lado o apelo comercial da data, e o caráter de festividade familiar, a
exemplo do Natal, nossa atenção e consciência espíritas requerem uma explicação
plausível do significado da data e de sua representação perante o contexto
filosófico-científico-moral da Doutrina Espírita.
Historicamente, a Páscoa é a junção de duas festividades muito antigas, comuns entre os povos primitivos, e alimentada pelos judeus, à época de Jesus. Fala-se do “pesah”, uma dança cultural, representando a vida dos povos nômades, numa fase em que a vinculação à terra (com a noção de propriedade) ainda não era flagrante.
Também
estava associada à “festa dos ázimos”, uma homenagem que os agricultores
sedentários faziam às divindades, em razão do início da época da colheita do
trigo, agradecendo aos Céus, pela fartura da produção agrícola, da qual
saciavam a fome de suas famílias, e propiciavam as trocas nos mercados da
época.
Ambas
eram comemoradas no mês de abril (nisan) e, a partir do evento bíblico
denominado “êxodo” (fuga do povo hebreu do Egito), em torno de 1441 a.C.,
passaram a ser reverenciadas juntas.
É esta a
Páscoa que o Cristo desejou comemorar junto dos seus mais caros, por ocasião da
última ceia. Logo após a celebração, foram todos para o Getsêmani, onde os
discípulos invigilantes adormeceram, tendo sido o palco do beijo da traição e
da prisão do Nazareno.
Mas há
outros elementos “evangélicos” que marcam a Páscoa.
— Isto
porque as vinculações religiosas apontam para:
*A
quinta-feira,
*A sexta-feira santa,
*O sábado de aleluia,
*E o domingo de páscoa.
*A sexta-feira santa,
*O sábado de aleluia,
*E o domingo de páscoa.
Os
primeiros relacionam-se ao “martírio”, ao sofrimento de Jesus, tão bem
retratado neste último filme hollyodiano (A Paixão de Cristo, segundo Mel
Gibson), e os últimos, à ressurreição e a ascensão de Jesus.
No que
concerne à ressurreição, podemos dizer que a interpretação tradicional aponta
para a possibilidade da mantença da estrutura corporal do Cristo, no
post-mortem, situação totalmente rechaçada pela ciência, em virtude do
apodrecimento e deterioração do envoltório físico.
As
Igrejas cristãs insistem na hipótese do Cristo ter “subido aos Céus” em corpo e
alma, e fará o mesmo em relação a todos os “eleitos” no chamado “juízo final”.
Isto é, pessoas que morreram, pelos séculos afora, cujos corpos já foram
decompostos e reaproveitados pela terra, ressurgirão, perfeitos, reconstituindo
as estruturas orgânicas, do dia do julgamento, onde o Cristo, separá justos e
ímpios.
A lógica
e o bom-senso espíritas abominam tal teoria, pela impossibilidade física e pela
injustiça moral. Afinal, com a lei dos renascimentos, estabelece-se um critério
mais justo para aferir a “competência” ou a “qualificação” de todos os
Espíritos. Com “tantas oportunidades quanto sejam necessárias”, no “nascer de
novo”, é possível a todos progredirem.
Mas, como
explicar, então as “aparições” de Jesus, nos quarenta dias póstumos,
mencionadas pelos religiosos na alusão à Páscoa?
Antes
vamos usar a lógica e a fé raciocinada: Se Jesus tivesse ressuscitado Ele não
precisaria abrir lápide, isso significa que alguém tirou seu corpo para
sepultá-lo. A fenomenologia espírita (mediúnica) aponta para as manifestações
psíquicas descritas como mediunidades.
Em
algumas ocasiões, como a conversa com Maria de Magdala, que havia ido até o
sepulcro para depositar algumas flores e orar, perguntando a Jesus – como se
fosse o jardineiro – após ver a lápide removida:
“— Para
onde levaram o corpo do Raboni”, podemos estar diante da “materialização”, isto
é, a utilização de fluido ectoplásmico – de seres encarnados – para
possibilitar que o Espírito seja visto (por todos).
Igual
circunstância se dá, também, no colóquio de Tomé com os demais discípulos, que
já haviam “visto” Jesus, de que ele só acreditaria, se “colocasse as mãos nas
chagas do Cristo”.
E isto,
em verdade, pelos relatos bíblicos, acontece. Noutras situações, estamos diante
de uma outra manifestação psíquica conhecida, a mediunidade de vidência,
quando, pelo uso de faculdades mediúnicas, alguém pode ver os Espíritos.
A Páscoa,
em verdade, pela interpretação das religiões e seitas tradicionais, acha-se
envolta num preocupante e negativo contexto de culpa.
Afinal,
acredita-se que Jesus teria padecido em razão dos “nossos” pecados, numa alusão
descabida de que todo o sofrimento de Jesus teria sido realizado para “nos
salvar”:
Dos
nossos próprios erros,
Ou dos erros cometidos por nossos ancestrais,
Em especial, os “bíblicos” Adão e Eva, no Paraíso.
Ou dos erros cometidos por nossos ancestrais,
Em especial, os “bíblicos” Adão e Eva, no Paraíso.
A
presença do “cordeiro imolado”, que cumpre as profecias do Antigo Testamento,
quanto à perseguição e violência contra o “filho de Deus”, está flagrantemente
aposta em todas as igrejas, nos crucifixos e nos quadros que relatam – em cores
vivas – as fases da via sacra.
Esta
tradição judaico-cristã da “culpa” é a grande diferença entre a Páscoa
tradicional e a Páscoa espírita, se é que esta última existe.
Em
verdade, nós espíritas devemos reconhecer a data da Páscoa como a grande – e
última lição – de Jesus, que vence as iniqüidades, que retorna triunfante, que
prossegue sua cátedra pedagógica, para asseverar que “permaneceria eternamente
conosco”, na direção bussolar de nossos passos, doravante.
Nestes
dias de festas materiais e/ou lembranças do sofrimento do Rabi, possamos nós
encarar a Páscoa como o momento de transformação, a vera evocação de liberdade,
pois, uma vez despojado do envoltório corporal, pôde Jesus retornar ao Plano
Espiritual para, de lá, continuar “coordenando” o processo depurativo de nosso
orbe.
— Longe
da remissão da celebração de uma:
Da
ressurreição de Jesus,
Da festa pastoral ou agrícola,
Ou da libertação de um povo oprimido ...
Da festa pastoral ou agrícola,
Ou da libertação de um povo oprimido ...
... Possa
ela ser encarada por nós, espíritas, como a vitória real da vida sobre a morte,
pela certeza da imortalidade e da reencarnação, porque a vida, em essência, só
pode ser conceituada como o amor, calcado nos grandes exemplos da própria
existência de Jesus, de amor ao próximo e de valorização da própria vida.
Nesta
Páscoa, assim, quando estiveres junto aos teus mais caros, lembra-te de
reverenciar os belos exemplos de Jesus, que o imortalizam e que nos guiam para,
um dia, também estarmos na condição experimentada por ele, qual seja a de
“sermos deuses”, “fazendo brilhar a nossa luz”.
Comemore,
então, meu amigo, uma “outra” Páscoa.
A sua Páscoa, a da sua transformação, rumo a uma vida plena.
A sua Páscoa, a da sua transformação, rumo a uma vida plena.
Marcelo
Henrique Pereira, Mestre em Ciência Jurídica, Presidente da Associação de
Divulgadores do Espiritismo de Santa Catarina e Delegado da Confederação
Espírita Pan-Americana para a Grande Florianópolis (SC)
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